domingo, 28 de junho de 2009

Michael Jackson e nós, pobres mortais!

Ele é filho da mídia, mas também seu procriador. E enquanto tal viveu sob a égide de sua ambigüidade: anjo para uns, demônio para outros.

Certamente nessa aldeia global, a mídia não existiria se não tivesse o que mostrar. E ele estava predestinado a ocupar o seu lugar nela, desde cedo, aos seis anos, quando despontou para a notoriedade, a fama, o sucesso através de uma carreira artística que bateu recordes em vendas de discos, ajudou a erigir a pop music e a romper a barreira racial.

Com o passar do tempo e com a fama, o menino prodígio passou a ser conhecido como “o cara”, que tinha carisma, notória capacidade de se comunicar com qualquer tipo de platéia. Trouxe alento à juventude negra, liderou uma legião de adeptos do hip hop e soube reunir, em suas apresentações artísticas, música, tecnologia e coreografia, da qual ficou conhecido por seu “moon walker”. Detentor de muita criatividade, inventividade e senso de oportunidade profissionais também exibiu, em sua famosidade, suas excentricidades, seus escândalos, bem como a evidência, pelas acusações judiciais a que teve que responder. Assim viveu e também morreu Michael Jackson.

Mas, ao escrever esse artigo, confesso não alimentar a preocupação de fixar-me em enaltecer ou vilipendiar esse ícone da pop music, pois certamente ele será tratado, retratado, coberto pelo manto destinado aos grandes mitos ou mesmo despido pela mesma mídia que o colocou em evidência. A mídia cuidará de lembrar Michael Jackson.

Como diz a jornalista e também minha querida e dileta amiga Maristela Bairros, em seu blog, http://clinicadapalavra.blogspot.com e em sua coluna na revista eletrônica coletiva.net : “Porque, na verdade, quando desaba um fato da importância da morte de um ícone, mito, símbolo (e por aí vai a cantilena de adjetivos e definição) como MJ, é um Deus nos acuda, em especial nas grandes redes. Todo mundo fica lento, burro, indeciso, a gente percorre os endereços eletrônicos de jornais, tidos como exemplo de bom jornalismo, e a tela não muda, nada acontece de significativo. E quando finalmente confirma-se qualquer coisa, começa o festival de lugar-comum. O besteirol se instala, os arquivos voltam à telinha, overdose de coisas iguais, sem informação que importe, ao contrário, cuidando para não trazer o lado podre do morto para a linha de frente. Afinal, se o cara morreu virou santo. E o povo se refugia mesmo no msn e no twitter, para brincar de jornalista”.

Dessa forma, quero voltar a minha atenção para buscar entender o comportamento dessa legião de fãs que agora sente a sua morte como a de um familiar próximo. São milhões, em todo o mundo, que choram e se sentem órfãos, mesmo integrando diferentes raças, culturas e habitando diferentes espaços geográficos. São pessoas que, embora não entendam a língua falada por seu líder, certamente estabeleceram vínculos de comunicação através da linguagem universal dos sinais, da dança e da música.

Certa vez, um discípulo perguntou a seu Mestre: “Como se morre”? E o Mestre respondeu de forma simples e direta: “Morre-se como se vive”. O final de uma vida, seja de uma figura humana que passou sua existência no anonimato ou mesmo a de um grande expoente, lembra para quem fica, a sua própria morte. Há um vocativo subjacente que diz: “Michael Jackson morreu. Eu também vou morrer”. São nossos apegos e nossos laços que desejam uma longa vida. É a morte súbita que nos coloca a dimensão de que a vida é curta e que não podemos deixar para amanhã aquilo que devemos fazer hoje. Quando nascemos, seja em berço rico ou paupérrimo, recebemos como dote, uma carga vital a ser gasta. Uma vez esgotado esse manancial, devermos prestar contas de como dispomos desse “capital vital”.

É como ir ao banco e contrair um empréstimo, através do qual será colocada uma determinada soma em nossas mãos, para dispô-la segundo o nosso arbítrio. Chegará um momento em que deveremos prestar conta do dinheiro recebido. Michael Jackson se preparava para uma nova turnê, mas, em lugar disso, deverá, agora, não mais se apresentar a seus fãs, mas fazer seus relatórios a quem lhe concedeu o seu crédito de vida.


Sua morte nos deixa uma lembrança: de que a vida é curta e deve ser encarada com responsabilidade e discernimento. E que o único patrimônio que possuímos, capaz de nos acompanhar, após essa forma de vida, é mesmo nossa alma. E é dela que devemos cuidar. O resto é descartável. Não nos pertence.

Entre os vários depoimentos sobre Michael Jackson, um me chamou a atenção, prestado por um jornalista, ao qual não pude guardar o nome, que disse: “Ele era uma pessoa doce, com voz macia, meio afeminada, mas quando caminhava tinha um jeito de uma entidade que tentava se fixar no chão”. Todos nós carregamos uma entidade que tenta se ater aos princípios regidos pela matéria. Somos espíritos que realizam experiências nessa forma de vida e não o contrário. Quem sabe se nos apercebêssemos disso poderíamos mudar o valor e os rumos dados à nossa própria existência, muitas vezes sem sentido, muitas vezes sem propósitos definidos.

Tenho me perguntado, muitas vezes, porque criamos mitos em nossas vidas? Porque algumas pessoas são deliberadamente elevadas a um patamar acima dos nossos, como se fossem semideuses? E o que elas teriam a ver com nossas próprias vidas? A criação do mito, pelo ser humano, está ligada aos profundos mistérios que marcam nossa vida interior. Pela ausência interior de sinais, a serem seguidos, nos sentimos atraídos por fontes ricas e vivificadores que existem em nossos semelhantes.

Como se nossos vazios pudessem ser preenchidos por outros, atribuídos por nós como detentores de uma vida que não possuímos, mas que fazem parte de nossas fantasias. Não copiamos a tendência hipocondríaca do artista, que muitas vezes se manifestou através do uso de máscaras e luvas, nem a sua condição de ausência de sociabilidade, fora dos palcos, que o levava a permitir que apenas um reduzidíssimo número de pessoas, familiares a ele, chegassem perto, ocasionado pelos traumas gerados por um pai severo que lhe surrava, quando pequeno. Nem por quaisquer outras excentricidades. Mas, sim, por sua musicalidade, que despertava, no interior de cada fã, a sua própria alegria de estar vivo.

O que mais chamou a atenção em Michael Jackson foi sua capacidade de ousar a ousar em sua criação artística. Ser visionário, ter coragem e talento para propor algo novo. Tirar as pessoas da inércia e de intermináveis rotinas para viver algo nunca vivido ou experimentado. E levar a executar o que lhe fora proposto depois de ensaiado aos mínimos detalhes, até chegar quase à perfeição.

Dentro de cada um de nós existe a figura de um Michael Jackson, assim como existiu a de um Elvis Presley, John Lennon, Jimmy Hendrix ou qualquer outra figura mítica, que representa, através da condição artística, a própria criatividade, inventividade e renovação de fazer frente à rotina, à mesmice, à preservação do status quo, que nos detém e nos faz separar realidade de fantasia. Como se tudo isso nos levasse, de forma segura, a deter a nossa vida. Como se ela fosse durar para sempre, e, principalmente, como se tivéssemos o carisma e a popularidade para ofuscar todas as limitações e medos que nos levam a economizar o caudal de vida, que recebemos ao nascer, mas que deverá terminar quando menos se espera. Dançar e cantar são formas de lembrar que estamos vivos e que, assim, estamos reverenciando a enorme herança que recebemos, ao botarmos o pé neste mundo, cheio de possibilidades.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Da realidade e da ficção em nossas vidas

Pesquisas apontam um número médio de quatro horas diárias como o tempo que uma pessoa, no Brasil, gasta à frente da telinha. Durante essa jornada considerável, entre as 24 horas disponíveis, alimenta emoções, sentindo-se parte de uma aldeia global de quase sete bilhões de pessoas. É um preço caro, se considerarmos que, ao olhar para telinha, deixa de olhar para aqueles que estão mais próximos. Por isso os diálogos desaparecem da vida familiar, uma vez que se dá mais atenção ao casal que nos visita, através da telinha, Willian Bonner e Fátima Bernardes, do que a um familiar, também interessado no que esses âncoras estarão informando.



Em minha casa, a telinha fica num dos dois lugares mais estratégicos da edificação: a cozinha, uma vez que os telejornais acontecem exatamente na hora das refeições: entre 7 h e 8h, a partir das 12h30m, às 19 h e às 20h. A alimentação é sempre feita, assim, ingerindo-se denúncias, tragédias, medidas de impacto governamental, desastres ambientais, crimes, protestos, alta de preços e tudo mais, que é mórbido e que esteja no cardápio de nossos editores para nos mostrar, para nos chamar à atenção e gerar ibope, uma vez que notícia boa é rara e não atrai a atenção do espectador.


Findo um telejornal, chega o momento de deixarmos a telinha um pouco mais ligada, mais presente, mais ruidosa, em nossa vida, talvez à espera de novas “noticias”, que, agora, deixam, de ser produzidas por jornalistas formados graças à decisão do STF.


Esse é o momento em que a telenovela invade nossos lares. Por seu efeito lúdico, a telenovela nos tira de nossas apreensões diárias e nos conduz ao universo de personagens envolvidos com problemáticas semelhantes aos nossos, porém dissociados de nossas emoções existenciais. É um alívio saber que aquilo não esteja se passando conosco, porém com Maya, Raj, Bahuan, Opash e outros. E também com a Santinha, a Beata, o Zeca (Filho do Demo) e demais integrantes do enredo.


Para atrair nossa atenção, os autores utilizam um sentido dialético: incorporam, em suas tramas, situações da vida real, mas, ao mesmo tempo, criando, através da ficção, elementos alternativos, para dissociá-la de nossa realidade vivencial. Isso é: é parte de nós, mas também não nos pertence.


Com efeito, a vida é dualista em sua manifestação. Sempre digo que o mal está contido no bem e que o bem está contido no mal. Para isso sempre dou um exemplo: num dia de calor, experimente tomar um chopp bem gelado, com colarinho, sentado à mesa de um bar que contenha música ao vivo. A bebida desce redonda e nos estimula a querermos mais. Isso é bom. Mas imagine que a noite seja criança e que ela venha amadurecer após tomados 20 chopps. No outro dia você jura nunca mais tomar aquela bebida dos demônios, que lhe fez sentir um gosto de guarda-chuva na boca. Isso é ruim. Então eu digo que toda a experiência depende de sua medida. Assim como não existe comida ruim, porém mal feita, assim também nossa vida depende do tempero que colocamos em nossas experiências.


São desses temperos que as novelas são feitas, pois elas contêm um pouco de nós e nós carregamos um pouco do que elas acrescentam. Dia desses fiquei observando a novela Paraíso e fiquei me perguntando o que ela poderia dizer sobre nossas vidas. Entre os personagens, inspirados em nós, espectadores, se destacam três: uma personagem que busca, a vida inteira, ser beata. Seu maior sonho era tornar-se freira. Mas, embora eu não conheça direito o enredo, sei que ela acabou se casando e gerando uma filha. Frustrada na concretização de seus sonhos, ela passou a depositar na filha a forma de ver materializada o seu ideário de vida. E, para tanto, chamou sua dileta filha de “Santinha”, para personificar suas intenções.


Isso é: fez da vida da filha a própria a continuação de sua trajetória. Porém, a mocinha alimentava seus próprios sonhos, apaixonando-se por Zeca, considerado, naquelas paragens, o verdadeiro filho do Demo. Nesse momento da trama a mocinha está reclusa no convento, vivendo seu momento de expiação, dividida entre seu amor carnal e sua vocação transcendente.


É comum, na vida real, pais desejarem que seus filhos venham a concretizar seus sonhos, nunca realizados. Esquecem-se que cada alma traz consigo o seu próprio caminho, a ser trilhado, e que, muitas vezes, o destino lhe reserva caminhos muitíssimos diferentes daqueles percorridos por seus pais. Cada alma traz, desde o momento em que chegou a esse mundo, a sua vocação e, ao longo de sua existência, ela vai simplesmente reavivando aquilo que já sabe.


É por isso que filhos não seguem a profissão dos pais, filhos fracassam onde seus pais tiveram êxito ou alcançam êxito onde seus pais falharam. É por isso que filhos, nascidos em lares paupérrimos chegam a amealhar, durante suas vidas, verdadeiras fortunas. E também crianças nascidas em berço de ouro acabam por jogar suas fortunas fora, tornando-se, ao longo do tempo, desprovidos de quaisquer reservas financeiras.


É difícil levar pais a acreditarem que criam seus filhos para o mundo e que seu apego, se não é banido por sua livre consciência, é feito de forma compulsória, pelos ditames da vida. Também é difícil fazê-los crer que cada alma carrega, em si, a sua verdadeira busca pela felicidade e que não lhes cabe gerar infelicidade simplesmente para não renunciarem a seus egos e a seus apegos à personalidade.


É por isso que muitos lares são desfeitos: porque as pessoas se esquecem que o maior objetivo de um ser humano é ser feliz. E é por isso que, inteligentemente, o autor da novela Paraíso consegue retratar o verdadeiro sentido dualista, tanto de personagens criados por ele, como seres humanos aos quais, ao escrever, se inspirou. Isso é: a novela se passa em meio a um verdadeiro paraíso, onde a natureza se mostra pródiga e exuberante. Porém seus personagens ignoram toda essa fortuna ambiental, que receberam de herança, e ficam enredados em seus egos, criando um mundo à sua imagem e semelhança.


Um mundo, concebido, a partir dos elementos representados pelos personagens principais, que nesta forma de existência, desfrutam de um verdadeiro paraíso e também convivem com um verdadeiro purgatório, criado por mentes que buscam satisfazer as suas próprias ambições, buscar suas ascendências sobre os demais, alcançar a conquista do poder e da riqueza, da notoriedade pública e da esperança de que as pessoas venham a se tornar iguais ao universo imaginado em suas dimensões egocêntricas.

É, também, por isso que o autor traz, para a trama, situações da vida real, como a bajulação, o temor de as pessoas não se sentirem aceitas, pelas demais, caso resolvam assumir suas autênticas formas de vida. E também porque muitos têm medo, não de fracassar, mas de chegar ao êxito e se tornar aquilo que idealizaram para si mesmos.


Realidade e ficção representam apenas os dois lados de uma só moeda, que simboliza a realidade dualística, que habita a alma humana, estigmatizada por uma mãe, fraca por dentro e que demonstra, externamente, a rigidez de suas convicções, uma filha forte por dentro, que demonstra, externamente, a fragilidade e a condição de se amalgamar às imposições alheias, alimentada por suas formas de apego, ligadas a um bom moço, que, por sua vez, carrega o estigma do mal a ser deixado para trás em função de uma vida transcendente.



Em sua senda, os homens alimentam, através de suas personalidades, o sonho da eternidade. Mas muitos seres humanos confundem a evolução de seus estados de consciência com uma vida voltada a alcançar a santidade e a perfeição aqui mesmo, nesta forma de vida. Somos seres imperfeitos, em busca de evolução e não da santificação. Tal direcionamento requer não o polimento de nossa personalidade, mas o seu esvaziamento progressivo para que, em seu lugar, seja ocupada pela substância crística e nos leve ao mundo divino e ao final do caminho, que é a verdadeira liberação de nossos apegos e personificações que nos detém em nossa trajetória.


E tudo isso depende não do bem e do mal, mas da medida e do tempero que demos à nossa existência, que tem, assim como num cenário de novela, o paraíso, de um lado, e provação e a dor de outro. Uma caminhada semelhante à letra da música de Gilberto Passos Gil Moreira, que diz:


SE EU QUISER FALAR COM DEUS
Gilberto Gil
1980


Se eu quiser falar com Deus
Tenho que ficar a sós
Tenho que apagar a luz
Tenho que calar a voz
Tenho que encontrar a paz
Tenho que folgar os nós
Dos sapatos, da gravata
Dos desejos, dos receios
Tenho que esquecer a data
Tenho que perder a conta
Tenho que ter mãos vazias
Ter a alma e o corpo nus
Se eu quiser falar com Deus
Tenho que aceitar a dor
Tenho que comer o pão
Que o diabo amassou
Tenho que virar um cão
Tenho que lamber o chão
Dos palácios, dos castelos
Suntuosos do meu sonho
Tenho que me ver tristonho
Tenho que me achar medonho
E apesar de um mal tamanho
Alegrar meu coração
Se eu quiser falar com Deus
Tenho que me aventurar
Tenho que subir aos céus
Sem cordas pra segurar
Tenho que dizer adeus
Dar as costas, caminhar
Decidido, pela estrada
Que ao findar vai dar em nada
Nada, nada, nada, nada
Nada, nada, nada, nada
Nada, nada, nada, nada
Do que eu pensava encontrar

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Diploma para Jornalismo? Agora não mais!

O Supremo Tribunal Federal decidiu, ontem (17 de Junho de 2009), a revogação da exigência de diploma para o exercício da profissão de jornalista. Foram 8 votos contra e apenas um a favor da manutenção da matéria, derrubando, assim, um decreto-lei, de 1969, época do regime militar, que estabelecia a obrigatoriedade deste requisito para habilitação profissional. O Presidente do STF, Gilmar Mendes, considerou o jornalismo uma profissão diferenciada, vinculada ao exercício amplo das liberdades de expressão e de informação, cuja exigência profissional fere, segundo ele, a Constituição Federal, que assegura essas liberdades.


Para tanto argumenta: “O jornalismo é a própria manifestação e difusão do pensamento e da informação de forma contínua, profissional e remunerada. Os jornalistas são aquelas pessoas que se dedicam profissionalmente ao exercício pleno da liberdade de expressão. O jornalismo e a liberdade de expressão, portanto, são atividades imbricadas por sua própria natureza e não podem ser pensadas e tratadas de forma separada”. Mesmo assim o ministro reconheceu a importância dos cursos superiores, com disciplinas técnicas sobre redação e edição, ética e teoria da comunicação para uma formação profissional sólida para o exercício de jornalismo.

“Essa é uma razão importante para afastar qualquer suposição no sentido de que os cursos de graduação em jornalismo serão desnecessários após a declaração de não-recepção do artigo 4º, inciso V, do decreto-lei nº 972/1969 (que estabelecia a obrigatoriedade do diploma”, afirmou.


Nesse sentido, o Presidente do STF também considerou não ser necessário o diploma, de forma obrigatória, para outras profissões, pois “tais cursos são extremamente importantes para o preparo técnico e ético de profissionais que atuarão no ramo, assim como o são os cursos superiores de comunicação, em geral, de culinária, marketing, desenho industrial, moda, costura, educação física, dentre outros vários, que não são requisitos indispensáveis para o regular exercício das profissões ligadas a essas áreas”, esclareceu.


Concordando com ele, o ministro Carlos Ayres Britto afirma: “nesse campo, nessa matéria, a salvaguarda da sociedade é não restringir nada”. O único ministro a votar a favor da obrigatoriedade do diploma, Marco Aurélio Mello, afirmou que o jornalista tem de ter “técnica para entrevistar, reportar e pesquisar: ”devo presumir que o que normalmente ocorre, não é o excepcional que, tendo o profissional o nível dito superior, estará mais habilitado à prestação de serviços profícuos à sociedade brasileira”, complementou.


De uma forma geral, os ministros se pronunciaram com base no que acreditam ser um excesso de regulamentação das profissões e que muitos profissionais, como Gabriel Garcia Marquez, Nelson Rodrigues ou Machado de Assis exerceram o jornalismo sem necessariamente terem um curso superior. É praticamente unânime, entre os ministros, a assertiva de que essa obrigatoriedade violava a atual Constituição Federal que garante a liberdade de profissão e de imprensa e prevê o direito ao livre trabalho e à livre expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação.

Há que se salientar que a matéria, votada ontem, não mereceu, antecipadamente, pelo STF, quaisquer aberturas para ouvir, a priori, a parte mais interessada: a sociedade civil, respaldando seus ministros em pareceres que se restringiram aos aspectos legais e às opiniões pessoais daqueles que exerceram o seu voto.


Com isso, deixaram à própria sociedade civil os efeitos de uma matéria que se revela complexa, polêmica e que, certamente, não desaparecerá tão cedo das rodas de discussões. Nessa verdadeira plêiade de opiniões e posições, este autor deseja deixar claro a sua: ser contrário à desregulamentação da obrigatoriedade de existência de diploma para o exercício da profissão de jornalista.

Não por motivos corporativistas, mas porque a decisão do STF vai de encontro à tendência atual de qualidade no trabalho. Se o argumento, apresentado pelos excelentíssimos senhores ministros, de que há excesso de regulamentação de profissões, é considerado válido, podemos pensar em desregulamentar as profissões de professor, por não ser mais necessário assimilar conteúdos didático-pedagógicos, do médico, por não necessitar mais de conhecimentos de anatomia, do advogado, por não precisar mais de fontes de direito, dentre outros, já que todos eles manifestam e fazem a difusão do pensamento e da informação de forma contínua.


O que dá embasamento à profissão de jornalista é justamente a existência de uma ciência, a da Comunicação Social, que embasa e dá provimento à forma como se processa a interação de massa. Este autor ingressou na vida acadêmica universitária no ano seguinte à promulgação do decreto nº 972/1969. E pode afirmar que nunca se formou, nesse País, um profissional de Comunicação, mas de jornalismo, de publicidade, de relações públicas, cuja fundamentação teórico-metodológica esteve sempre amparada pela técnica e nunca pela ciência. A questão não reside em gerar técnicos de comunicação, habilitados para atuar em jornalismo, mas profissionais completos, com uma bagagem holística e pleno domínio das ferramentas para harmonizar-se às necessidades da comunicação de massa.

Mais do que nunca é preciso, de um vez por todas, gerar profissionais que estejam vinculados à formação humanística, capaz de dar sentido amplo à sua própria formação, englobando conhecimentos de filosofia, sociologia, antropologia, semiótica, aliada à visão operacional dos instrumentos utilizados pelos veículos onde atuará, capaz de dar ao profissional uma visão clara das responsabilidades que deverá considerar ao lidar com a opinião e a coisa pública.

Trata-se de dar provimento a tudo o que diz respeito à responsabilidade de lidar com a comunicação de massa, incorporando a preparação teórica e técnica de conhecimentos que estarão subjacentes ao exercício diário do jornalismo, de forma profissional embasada.

É fato que a revogação da obrigatoriedade, prevista no artigo 4º, inciso V, do decreto-lei nº 972/1969, não extinguirá o Curso Superior de Comunicação Social. Mas certamente que o bacharel ingressará no mercado de trabalho concorrendo com profissionais que não sentaram nos bancos da Escola Superior, não despenderam recursos, nem tempo, nem esforço cognitivo para se capacitar a estar melhor qualificado e preparado para o dia a dia jornalístico. E assim poderá existir, nas redações de jornais, uma verdadeira queda no patamar salarial em face da disponibilidade da força de trabalho que ingressa no mercado de trabalho somente contando com a cara e a coragem.

Num mundo do trabalho, que exige especializações acadêmicas, agora em nível de pós-doutorado, banalizando o grau de bacharelado, estamos possibilitando o surgimento de uma força de trabalho que prescinde da vida acadêmica e se apóia no provisionamento para chegar às redações, requerendo proventos mais baixos e superar com pragmatismo aquilo que deixa de aprender nos meios universitários. Bom para os empresários da comunicação, ruim para o corpo funcional que busca competência aliada à sólida formação acadêmica.

Além disso, qualquer desatino poderá ser escudado, por uma eventual situação de provisionamento, pela inexistência de um grau maior de aprofundamento em matérias que lhe serão inerentes ao exercício de sua profissão e por um pragmatismo restrito à vivência de redação. Ou pelo acesso ilimitado às informações disponibilizadas pela internet, sem a devida existência de uma metodologia de pesquisa e ou arcabouço teórico ligado ao objeto de sua atuação.

Não se trata de condenar a tudo o que fora gerado durante o regime militar, que, embora tendo deixado seqüelas traumatizantes à vida nacional, incorporou os anseios da própria sociedade onde se inseria. Se o advento de ares democráticos ensejou a revisão de todos os atos de exceção, não cabe outra coisa senão abrir, de forma verdadeiramente democrática, um fórum de debates acerca do exercício da atividade jornalística, seus atores e sua relação com a ciência que lhe dá embasamento: a Comunicação Social.

É o que comprova a pesquisa de opinião, realizada pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) que revelou, durante o último ano, que 74% dos dois mil entrevistados, em todo o território nacional, disseram ser a favor do diploma, contra 13,9% que defendem a atuação jornalística sem documento.

A Sociedade brasileira quer, sim, bons profissionais, que tragam em si a vocação às artes, à literatura e a uma situação que transcenda a muito mais do que ciência, muito mais do técnica, como diz o ministro Carlos Ayres Britto, mas que estejam devidamente capacitados, através dos bancos de cátedra, para desenvolver a sua visão analítica, a aprimorar o seu senso ético e para despertar-lhe consciência do papel social que ocupa dentro de uma sociedade da comunicação e da informação. E, principalmente a um registro qualificado junto ao Ministério do Trabalho, facultado a todos os que desejam desenvolver essas faculdades, mas agregado por um aperfeiçoamento conferido por um diploma. E nutrido não pelo interesse estrito de um profissional, mas dirigido a toda sociedade brasileira, principio e fim de todos os atos legais aos quais são depositários.

terça-feira, 9 de junho de 2009

Deus e eu no sertão

Este é o nome da música tema da atual novela das sete da Rede Globo, Paraíso, de Benedito Ruy Barbosa. Desde o momento que ouvi, pela primeira vez, a sua melodia, ela passou a despertar em mim sentimentos de simpatia, empatia e contentamento.

As telenovelas são criação genuinamente brasileira, cujo modelo é incansavelmente copiado mundo afora. Concebidas, inicialmente, para desempenhar um estratégico papel político e ideológico, durante o regime militar, perdurou através dos tempos e, hoje, despertam, em seus expectadores, duas funções: servir para extravasar as tensões, acumuladas durante o dia, e fazer-lhes despertar os seus imaginários, levando-os a desenvolverem, dentro de si, questões lúdicas, tão amordaçadas por um sistema de vida atribulado e imediatista. Isso é: a telenovela está concebida para mexer inteiramente com emoções e sentimentos de quem a assiste.

Pelas inúmeras tarefas assumidas, inclusive envolvendo uma verdadeira biblioteca de referências bibliográficas a serem lidas, não tenho me deixado à frente da telinha para me envolver nas tramas criadas por seus autores. Nem por isso a música tema deixa de despertar em mim aspectos interiores de conteúdo emocional e lúdico. Sua letra é simples, direta, objetiva, e, principalmente, curta, mas contém o apelo necessário para quem deseja fazer ressurgir, em sua vida, valores essenciais e permanentes.

Estamos tão cheios de coisas de fora que nem sequer chegamos a prestar a atenção em nossos valores internos, naquilo que nos é essencial e permanente em nosso mundo interior. Para reconhecê-los é necessário reconhecer, primeiro, a existência de uma vida interior, tarefa nem sempre fácil, nos dias atribulados, quando esquecemos do que é essencial, porque nos esquecemos de olhar para dento de nós.

Essa música traz esse sentimento de plenitude dentro de nós, porque resgata três valores essências ao homem: Deus, natureza e felicidade. Isso é: a letra fala de um ser humano que carrega Deus dentro de si, trabalha feliz, em meio à natureza pródiga. Não está fixado nas horas, deixa o tempo passar e vive apenas a essência delas. Sabe que é hora de trabalhar quando o dia desperta. Canta enquanto trabalha. À noite assiste a um verdadeiro show de estrelas, tão difícil de enxergar no meio urbano. Quando quebra a rotina, vai à festa na cidade, à missa e ver sua namorada. De volta se hipnotiza com o brilho do fogo de lenha, ouve o som da mata e, depois, alimenta sua alma com o som de um violão. E assim segue a vida, sem solidão, pois, para quem tem Deus no coração, a vida é uma verdadeira plenitude. Os autores, Vitor & Léo, Caldas Novas, Goiás, ocupam o horário da 7 para despertar esse lado tão lúdico, mas também tão verdadeiro, de que é preciso parar, pensar e não perder de vista quem somos nós e para onde estamos indo.

Assim dispuseram a sua letra:

Nunca vi ninguém
Viver tão feliz
Como eu no sertão
Perto de uma mata e de um ribeirão
Deus e eu no sertão.

Casa simplesinha,
Rede prá dormir
De noite um show no céu
Deito prá assistir
Deus e eu no Sertão

Das horas não sei,
Mas vejo o clarão
Lá vou eu cuidar do chão
Trabalho cantando
A Terra é a inspiração
Deus e eu no Sertão.

Não há solidão
Tem festa na vila
Depois da missa vou
Ver minha menina

De volta para casa
Queima a lenha no fogão
E junto ao som da mata
Vou eu e um violão.