terça-feira, 31 de janeiro de 2012

A Saúde Pública que conheço (conhecemos) no Brasil

- Tenho medo de ficar doente, em face do que tenho visto em relação à saúde no Brasil!

Essa frase poderia muito bem ser dita por mim, por você, que me  lê neste momento, ou por qualquer outro cidadão brasileiro que, na atualidade, precisa de atendimento médico no Brasil, seja ele público ou privado.

O autor dessa frase, alguém de minhas relações, possui um atributo muito especial: ele é médico, profissional de larga experiência e longos anos de exercício profissional. Já ingressando na chamada terceira idade, sabe que seu corpo já apresenta sinais dos anos vividos e que, em algum momento, terá de requerer a ajuda do sistema de saúde brasileiro para cuidar de eventuais problemas que possam afetar o seu organismo.

Ao ouvir tal desabafo, de imediato me fiz, silenciosamente, uma pergunta que você também deve estar se fazendo neste momento:

-Poxa, se ele, que é médico, diz isso, o que dizer de mim, que sou um simples cidadão em busca de um dos direitos mais elementares, garantidos pela própria Constuição Brasileira?

Todos  nós temos as nossas histórias para contar, experiências pessoais que nos levam à certeza de que, quem está doente, neste País, é o sistema de saúde brasileiro. Nós somos simplesmente o efeito colateral.

No dia 5  deste mes comecei a sentir anomalias no sistema urinário. Inúmeros fatores podem ocasionar tais sintomas, associados a causas diversas. Pelo desconforto e alerta que o organismo começou a apresentar, seria necessária uma ação urgente para diagnosticar e tratar o problema.

No sistema público, gerenciado pela Prefeitura Municipal de Vitória, em convênio com o SUS, a previsão de conseguir uma consulta com médico especialista, foi de cerca de cinco a seis meses. Seria tarde demais, pensei. Então parti para o Plano B, de buscar um especialista credenciado por meu Plano de Saúde.

Não havia. Descobri, após buscar mais de 10 medicos urologistas, que nenhum era credenciado. Todos eles só atendiam consultas particulares. Até poderia recorrer a uma consulta paga. Mas os médicos, hoje, só fazem um diagnóstico mediante exames médicos. Isso  poderia engrossar as despesas. já que, provavelmente haveria mais de um exame para fazer, em laboratórios diferentes. E ainda teria que retornar ao médico pago para efetuar um  novo desembolso, ai sim, para elaborar o diagnóstico.

Consultas pagas inviabilizam os médicos a requererem exames através de Planos de Saúde. Uma vez no sistema pago, teria que meter a mão na carteira a cada etapa. E isso sem falar numa possibilidade de internação hospitalar.

Após oito dias de convívio com uma situação de desconforto. alimentada pela total ignorância acerca do que tinha, consegui, finalmente, um especialista credenciado ao Plano. Como era de se esperar, exames foram solicitados, que deveriam ser providenciados por mim, em regime de urgência. Marquei a data com um laboratório de ultrassonografia, como parte dos exames. Após uma espera de dez dias, apresentei-me ao laboratório para cumprir com aquela etapa, que exigia bexiga cheia, um certo desconforto que certamente comecei a enfrentar. Mas após tomar muita água,  fiquei a frente de muita burocracia. O Plano vetou a autorização. Naquele momento só estavam atendendo casos de emergência e gestantes. O meu era urgente, mas poderia ser esperado. Só me restou passar ao banheiro e depois, retornar à minha residência.

Uma nova data foi marcada para doze dias após.

Passados 26 dias consegui, finalmente, fazer a ultrassonografia, depois de brigar, uma segunda vez, com a burocracia do Plano até liberar a autorização para o Laboratório.

Enquanto isso, acreditando que a burocracia é mais importante do que o bem-estar das pessoas, nem procurei mais o Plano para complementar os exames laboratoriais. Consegui uma consulta com uma médica clínica da família, que requisitou, pelo SUS, os demais exames faltantes, acrescentando mais ítens aos requeridos pelo médico especialista. Mas somente na semana seguinte.

Pelo sistema público, decorridas duas semanas, após o início dos sintomas, consegui coletar o material laboratorial para análise.

Tudo pronto? Não. Espera de mais dez dias para o resultado. Ontem, dia 30, retornei ao Posto de Saúde de Jardim da Penha, onde fiz a coleta, para receber os resultados. Mas me deparei com um aviso à porta principal do laboratório: "nos dias 30, 31 e 1° não haverá expediente na parte da tarde".

Sem muito acreditar no que a evidência de meus olhos mostravam, tive que voltar hoje pela manhã. Exame na mão, fui marcar a consulta.

Ao atendente lembrei minha condição de idoso, solicitando atendimento de urgência. Consegui atendimento.  Marquei para  o próximo o dia 27 de fevereiro para, finalmente, mostrar os exames. Após decorridos 54 dias de espera, poderei, finalmente, conhecer a causa desta anomalia funcional do sistema excretor de meu organismo.

Enquanto isso estarei me sentindo como todos os que me lêem: somos usuários de um sistema que agoniza, à espera de uma reformulação que vá ao encontro da grande massa "beneficiária", que continua aguardando o reconhecimento de sua condição cidadã.

Há que se salientar que, nunca em minhas gestões, pelos corredores de instituições públicas de saúde , deixei de encontrar funcionários cortezes, pois sempre procurei tratar o servidor público com o devido respeito. O mesmo acontece em relação aos profissionais do sistema privado de atendimento.

As falhas que observo possuem vertentes comuns: falhas no sistema de gestão, mal versação do dinheiro público, privilégios e apadrinhamentos, formação de grupos coorporativistas, alienação ou gestão autocrática da coisa publica.

O resto é consequência.

Profissionais que passam pelas escolas sem a devida qualificação, Médicos que se queixam de não reporem o que investiram nos bancos escolares, Planos de Saúde que dão prioridade a seu custeio, relativizando o atendimento que prestam, estabelecimetos públicos sem equipamentos, carência de funcionários e de gestão ineficiente.

E, enquanto nosso sistema de saúde não sofrer uma reformulação, continuaremos, todos, com muitas histórias para contar. E reafirmando o que ouvi de alguém de minhas relações:

Tenho medo de adoecer neste País.



2 comentários:

  1. Tio, lembrando nossa conversa outro dia, aqui na Itália a situação é mais animadora. Mas confesso que não sei por quanto tempo... A crise econômica é geral e, infelizmente, já alcançou outros setores como a educação. Na área acadêmica, além de universidades sucateadas e em prédios com péssimas condições de manutenção, já não se vê verbas para nada! Lamentável!

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    1. Sim, tenho acompanhado o noticiário pelos jornais e internet e isso nos faz lembrar do período de recessão que passamos. Quando analiso sob este angulo, fico a imaginar que uma boa parte das crises são provocadas por problemas de gestão e por especulações em busca de maior lucro. Oxalá consigas contornar as dificuldades para concluíres a tua estada aí e retornares com o dever cumprido e voltares para um Brasil com menos crise econômica, porém em situação de saúde precária.

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