quarta-feira, 6 de maio de 2015

Inhotim: um lugar de excelência



O ônbius sai do Terminal Rodoviário do Centro de BH às 8h15m até o estacionamento do Parque, após uma viagem de, aproximadamente, 1h50m. E retorna saindo do Parque às 16h30m. Assim chega-se a Inhotim, área natural localizada em Brumadinho, a 60 quilômetros de Belo Horizonte, ocupando uma área de 110 hectares de visitação, onde se encontram áreas de floresta e Jardim Botânico.

Ali há uma coleção de arte conhecida internacionalmente. As obras individuais estão dispostas em Galerias, assim como há obras externas permanentes. O espaço natural também está dotado de Fonte, Lago e Praça, havendo espaço para exposições temporárias. Segundo informações divulgadas pela Administração do Parque, cerca de 700 trabalhos e cerca de 200 artistas de diferentes países do mundo estão à espera de visitação.

Em relação às áreas naturais, Inhotim busca preservar espécies, desenvolver pesquisas botânicas como forma de contribuir para a manutenção da biodiversidade de Minas e do Brasil. Segundo a Direção do Parque, a coleção botânica, exposta pelos jardins, está assinada pelo paisagista Pedro Nehring ou mantida em estufas climatizadas, compreendendo cerca de 4.200 espécies de plantas, algumas em vias de extinção. Cuidar dos acervos natural e artístico às novas gerações também suscitou a elaboração de um programa para receber grupos organizados, segmentos empresariais do setor público e instituições que mantenham, como foco a cultura e a tradição.

Pelos motivos já expostos, anteriormente, restou apenas um dia de programação para conhecer aquele local. Além da biodiversidade foi possível conhecer a exuberante vegetação e a existência de espécies ameaçadas, como Paxiúba ou Socratea Exorrhisa (foto abaixo), que ocorre na América Central e América do Sul. Parece que o grosso caule vai se dividir em inúmeros outros, mais finos, se adentrando pela terra.. E há também bromélias imperiais, palmeira azul, jequitibá, pau brasil e orquídeas.



Paxiúba
Foto Fernando Sanchotene

 Uma vez que o visitante tenha passado pela recepção, logo vai encontrar belíssimas paisagens naturais, além de inúmeros caminhos ao logo de  uma vegetação exuberante.



As obras de arte estão distribuídas em inúmeras galerias, ao longo de uma extensa área do Parque. Os trechos mais ingrimes, nos diferentes caminhos de ligação para as galerias, é percorrido, através da utilização de veículos movidos à energia elétrica. Os trechos mais planos são percorridos à pé. 

Além das obras expostas nas galerias, o caminho está repleto de obras a céu aberto. 




Untitled (2000- 2005)
por Edgard de Souza
Andando pelo Parque, todos os cenários estão liberados aos registros fotográficos, menos as obras que estão expostas no interior das galerias. Por isso este blog não poderá ilustrar os espaços internos visitados. Como o tempo disponível era curto, o melhor era visitar os lugares mais distantes e, à medida da disponibilidade, os locais mais próximos do prédio da recepção. 

Por isso o objetivo maior foi chegar ao G10, um dos pontos mais distantes do Prédio da Expedição, no local denominado popularmente de "o som da terra" ou Sonic Pavillion (2009), por Doug Aitken.

Sonic Pavillion

Um prédio, em forma  redonda, envidraçado, conforme mostra a foto, em segundo plano, abriga um cilindro, de, aproximadamente, 30 ou 40 cm de diâmetro,está encravado na terra, medindo cerca de 250 m de profundidade. Ao longo dele há microfones, cujos captadores são de alta sensibilidade, que captam o som das profundezas, amplificam  e ecoam por aquele espaço interior. Muitas vezes o som é semelhante ao ronco de uma moto 450 ou 750 cilindradas. 

Ao ingressar no local, o guia nos adverte que, em seu interior, deve-se guardar amplo silêncio. Estávamos rumando ao prédio, quando se juntaram mais três franceses, dois deles falando muito pouco o português. Já nos preparávamos para o silêncio, enquanto adentrávamos até o interior da cúpula, quando fomos surpreendidos por um barulho de muitas risadas. Ao vislumbrarmos o salão, vimos um grupo de, aproximadamente, 25 estudantes de nível médio, oriundos da cidade de São Paulo. Concomitante à nossa chegada, o instrutor convidou meninos e meninas adolescentes a se sentarem, formando um círculo, equidistante ao ponto central, onde estava o cilindro que se adentrava pela terra. Na superfície desse cilindro havia um vidro grosso, transparente,  para permitir que o visitante pudesse olhar as profundezas. 

O convite veio extensivo a nós, mais velhos. Depois o instrutor, que é funcionário do local, chamou um a um os estudantes, para que fossem sentar em cima do buraco, em posição de lotus.  

O instrutor perguntava o nome de cada  estudante, e, em seguida, pedia para que o estudante da vez relatasse sua experiência, vivida naquele momento. "Depois de sentar aí, onde você está, você viu alguma mudança em sua vida?" perguntava ele. Muitos, tímidos, encabulados, falavam em tom baixo e se embaralham ao tentar descrever o que sentiam. O instrutor sempre repetia: "fale mais alto para que os outros te escutem".

Até que chegou a minha vez. Sentei-me da mesma maneira, em posição de lotus, no meio da sala, olhando em direção ao instrutor. O silêncio foi quebrado quando gritei bem alto. "Meu nome é Fernando"... silêncio. Veio a pergunta clássica: "Mudou alguma coisa em sua vida, sentado aí?" Eu disse que sim, que agora estava no centro dos acontecimentos. Gargalhada geral.... E depois continuei, dessa vez sério: " Sim. Mudou. Agora sinto uma incrível energia que vem do centro da terra, o som da Mãe Gaia. Disse que me sentia privilegiado por viver aquela experiência, pois a maioria dos homens vivem, hoje, em constante ruídos, sejam das cidades barulhentas, como pelo barulho ensurdecedor de nossos pensamentos. Raramente temos oportunidade, como naquele momento, de encararmos o silêncio e a energia gratificante que a Mãe Gaia nos proporcionava. Ninguém falou nada. 


Grupo desfeito, sala esvaziada, ali permanecemos. O silêncio voltou e as energias foram devidamente apreciadas. Até que, cinco minutos depois, um novo grupo de estudantes adentrou àquele local. Era hora de seguir em frente, pois o aquele momento pertencia aos mais jovens. Já a bordo de um carro elétrico, ouvi meninos e meninas, mais distantes, gritarem: "tchau Fernando, tchau Fernando...." Senti-me gratificado por aquelas manifestações de espontaneidade. 

Espaço reservado a Miguel Rio Branco
Foto Fernando Sanchotene 

As energias puras da terra se dissiparam logo, quando trocamos aquelas vibrações por algo mais pesado, ao adentrarmos no espaço conferido a Miguel Rio Branco (2008-2010). Esse autor elaborou um trabalho fotográfico desenvolvido numa região de prostituição de Salvador. Ao entrarmos na edificação, veio o aviso, dado por um de seus instrutores presentes, de que as imagens eram muito pesadas. E realmente eram. O trabalho mostra a exploração humana e a degradação das relações sociais, em meio ao ambiente deteriorado. Um mundo de cafetões, prostitutas, crianças desassistidas, pobreza em ambientes infectos.

Respiramos profundamente, aliviados, quando o ar puro da mata levou e lavou o que as energias acabaram por impregnar. A parada seguinte foi o espaço de Matthew Barney, denominado de Lama Lâmina. Ao adentrarmos pela estrutura de vidro, em forma de igloo, advinhas quem encontrei? Os estudantes, aqueles estudantes. 

O trabalho consiste na presença de um enorme trator, sujo de lama, cujas pás erguem uma árvore de plástico, com raízes e caule. A obra foi inspirada em ativista americana, que morou três anos em cima de uma árvore, tentando protegê-la de ser extirpada do local. O autor faz alusão à falta de sensibilidade dos homens à riqueza das árvores e das matas na vida moderna. Representa o dualismo entre o bem e o mal. O trator apresenta, na parte posterior e em baixo, uma área limpa, significando que ainda há esperanças para o homem.

E assim se sucederam as visitas aos galpões. Seguiu-se o trabalho de Johan Aheam, intitulado "Rodoviária de Brumadinho" cujas esculturas humanas impressionam por sua semelhança aos seres humanos.




Em área contígua o trabalho de Janet Cardiff, intitulado Forty part motet (2001) onde, em um espaço retangular, distribui-se cerca de 35 alto-falantes em forma circular, contendo, no epicentro, dois bancos, onde o visitante pode sentar para ouvir um coral de vozes. Espetacular. Em outro espaço a mesma artista, Janet Cardiff, realizou o trabalho "The Murder of Crows (2009), também utilizando música, por meio de muitos alto-falentes, porém através de sons urbanos e narrativas que utilizam o idioma inglês.

O trabalho exibido por Cristina Iglesias "Vegetation Room Inhotim (2010-2012), em meio a mata e a céu aberto, cria esculturas em forma de folhagens, pintadas na cor verde, lembrando estruturas em labirinto, culminando com um piso em tela, de onde se descortina as águas de uma nascente correndo por baixo do volume criado. Muitíssimo interessante.




O trabalho de Helio Oiticica, "Cosmococas 1.5" retrata rostos humanos cobertos pelo pó de cocaina, alguns deles desgrudando-se dos rostos, como sinal de esperança na redenção. O trabalho de Carlos Garaicoa, "Ahora juguemos a desaparecer (II) 2002), uma cidade em miniatura, confeccionada em forma de velas acesas, refletindo sobre os rumos escolhidos pelos homens e a circunstancialidade da vida. 

Sem estar incluído no roteiro, descobrimos, envoltos em árvores fechadas, uma capela ecumênica, do qual não resisti e entrei para ouvir um pouco de seu silêncio. Uma pausa espiritual antes de prosseguir o caminho. 

Novamente seguimos por aquelas trilhas, agradecidos por encontrarmos tamanha exuberância, paz, tranquilidade, em meio a um mundo conturbado, imediatista, egocêntrico, que não mudaremos, se não estivermos imbuídos  de uma utopia reparadora. 

O tempo se esgotava, inúmeras obras deixaram de ser vistas, ja que se aproximava, a passos largos, o momento de nos dirigirmos ao ônibus para retornar à capital mineira.Não demorou muito para Inhotim ficar para trás. Mas ficou na memória os bons momentos vividos em seus domínios, com a experiência vivida a certeza de que utilizamos muito pouco todos nossas sentidos,o tato, os cheiros, os sons puros, pois, em prol de nosso desenvolvimento, senão para vivermos a mesmice de nosso quotidiano, completamente adormecidos e anestesiados. Acordar, através deles, significa deixaremos a condição de ter, para ingressarmos na dimensão do ser, verdadeiramente holístico, realmente integrado a tudo o que se manifesta no Universo, visível e invisível. 

Sobre isso me lembro de uma frase, escrita por Joseph Campbell, em O Poder do Mito, sobre nossas buscas existenciais: " Dizem que o que todos procuramos é um sentido para a vida. Não penso que seja assim. Penso que o que estamos procurando é uma experiência de estar vivos, de modo que nossas experiências de vida, no plano puramente físico, tenham ressonâncias no interior do nosso ser e da nossa realidade mais íntimos, de modo que realmente sintamos o enlevo de estarmos vivos...."

4 comentários:

  1. Inhotim rima jardim. Um jardim de formas, cores, cheiros, sons....sensações. Um lugar especial, muito especial. Zeth

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    1. E tudo isso graças a você Zeth! Valeu a dica, valeu a experiência, valeu a cumplicidade e o compartilhamento. Abração!

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  2. Fiquei louca pra conhecer Inhotim! Foi muito bem descrito e me imaginei lá.

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  3. Sempre há um convite para experiências do gênero: coração aberto, disposição para adentrar pelo desconhecido, curiosidade ávida são condições que nos impelem a experências como essas. Abração!

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